NEURODIVERSIDADE [Artigo]

 Ainda é tempo de despertar!

De forma simplificada a NEURODIVERSIDADE é, no meu entendimento, o conceito das condições diferentes do cérebro, que estão para além de indivíduos com TEA (Transtorno do Espectro Autista), TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade), dislexia e dispraxia (distúrbio motor com base neurológica), entre outras condições de funcionamento cerebral. Penso, sobretudo, que não são anormalidades, mas sim, diferenças neurológicas, uma maneira particular de processar as informações e percepção de mundo, sociedade e comportamentos, a serem reconhecidas e respeitadas.

Se pensarmos que todos nós, neuroatípicos e neurotípicos, temos nosso próprio jeito de ver o mundo, todos nós somos neurodiversos! É uma premissa simples; temos nossa individualidade. Com isso, nossos olhares particulares em vastos aspectos. E por isso, esse meu raciocínio. Conheço inúmeros Autistas adultos que não assumem o próprio diagnóstico por medo da exclusão social, algo já presente desde nossa primeira infância. Inclusive, a palavra deficiente é muito assustadora para grande maioria dos Autistas que conheço. Para muitos essa palavra é pesada demais. Eu mesmo tendo a não incluir essa palavra em minhas campanhas em prol do Autismo, justamente para não afastar um público que vem crescendo em meu trabalho; os Autistas adultos. Não tenho problema com o termo deficiente ou deficiência, mas, quero que meu público fique cada vez mais próximo e principalmente sejam encorajados. E realmente, se comunicar com o mundo de outro modo está para além de um adjetivo. A #autismonãoéadjetivo vem ganhando FORÇA nos meios de comunicação. E porque algumas pessoas, inclusive, profissionais da área, querem definir a condição Autista com simples e frágeis cartilhas cheias de questões que tentam (sem sucesso) definir um indivíduo? É no mínimo curioso que alguns psicólogos e/ou psiquiatras se atrevam a delimitar um Espectro tão complexo quanto a própria atividade cerebral, com informações tão rasas. Imagine você ver/ler em uma cartilha como você (Autista) é ou como você interage com o mundo?! Estamos falando de um Espectro! Que é infinito!

Celebrar a Neurodiversidade é, em suma, celebrar a Humanidade! Acredito muito nisso! Porque os neurotípicos (ditos “normais”) são o outro lado dessa diversidade! Logo, estamos todos no mesmo “barco”/mundo. E como celebrar algo tão legítimo em nós, seres humanos, diante de tanta desigualdade e intolerância? É simples assim; se você não pensa, age, fala etc., como os outros, logo você está propenso a ser “excluído” do assunto, ou pior: excluído socialmente. Se não observarmos a Neurodiversidade como algo agregador, estaremos fadados a uma polarização discriminatória, onde todos saem perdendo. Pensem; se os governos municipais, estaduais e o federal investirem em políticas públicas de inclusão, especialmente, em ações de capacitação, intervenções de resultado em indivíduos com TEA, por exemplo, esse indivíduo terá uma evolução tão significativa que estará preparado para o mercado de trabalho. E ele irá contribuir com os “cofres públicos” com os impostos gerados por seus empregos e atividades profissionais. A conta é simples: o governo gastará mais com intervenções tardias como aposentadoria tenras e programas de benefícios, aos quais esses indivíduos tem direito, do que na preparação para o mercado de trabalho. Todos saímos ganhando! Acho que já estou mudando de assunto, né?! É! Minha mente é muito rápida!

Voltando a diversidade mental, estamos dentro de um imenso espectro humano. E para onde estamos navegando? Para onde vamos? É o que me pergunto sempre que me deparo com questões tão amplas como o quanto somos ignorantes ante nossa própria existência. Debatemos algo que deveria ser comemorado! Imagine se todos pensassem igual? Imagine um mundo onde ninguém vê além do comum? Imagine um coletivo de mentes que pensam a mesma coisa? O quão insignificante seria se todos tivessem a mesma visão das coisas? E com esse entendimento que percebo que muita gente não valoriza o “pensar diferente” e se afogam na própria mediocridade do pensar igual. Em tempos de intolerância validada pelo fanatismo exacerbado, “pensar diferente”, pode, em muitos casos, ser motivo de “linchamento” em redes sociais por exemplo. Reflitamos! Para onde estamos indo?

Recentemente, participei de um importante Seminário Internacional, promovido pela Galeria Aut, e o nome da minha palestra foi CRIATIVAmente. Uma clara alusão à mente criativa. Na ocasião, relatei minhas experiencias na primeira infância acerca da “funcionalidade” das coisas, dos objetos. Parece pouco? Pois bem, foi dando outra função aos meus brinquedos que meus Pais perceberam que eu via o mundo de outra forma. E essa “prática” criativa que fez minha mente evoluir para o campo da criatividade. Talvez, se intervenções disfuncionais dos meus tutores tivessem impedido minha imaginação de fluir, eu não teria seguido o caminho das Artes. Assistir meu trabalho ser tão influente e ajudar tanta gente é a recompensa por ter tido Pais tão inteligentes, isso é realmente um privilégio. O meu trabalho não ajuda apenas a transformar o olhar alheio, mas, também, emprega muita gente. Minha nova Exposição, por exemplo, empregará 42 pessoas diretamente. Serão dezenas de famílias beneficiadas com apenas um dos meus vários projetos. Isso sem contar a imensidão de pessoas que se beneficiarão com este projeto, porque essa Exposição tem como tema o Autismo e acontecerá em um aeroporto internacional. Com isso, a visibilidade é imensurável. Ter a real sensação que seu trabalho alcança e ajuda diretamente milhares, talvez milhões de pessoas é algo que faz acreditar que devemos Celebrar a Neurodiversidade!

Sobre o Dia do Orgulho Autista, comemorado em 18 de junho, tenho uma maneira muito particular de perceber essa data. Sempre me pergunto do que devo me orgulhar? Já que ter orgulho é, para mim, nutrir um sentimento de valor próprio, ter satisfação em ser ou fazer algo que me promova e que proporcione aos outros uma grande satisfação! Orgulho, sentir orgulho é ter Honra!  E tenho muita honra de ser quem eu sou, da forma que sou. Tenho Orgulho de ser Autista, de outra forma eu não seria quem eu sou, não seria capaz de realizar e produzir o que sou capaz de fazer! E o mais importante de tudo neste mundo; meus Pais sempre tiveram muito, Muito, MUITO Orgulho de mim! E como disse; isso é o mais importante porque sou parte deles e nenhum julgamento alheio e/ou olhar precipitado e raso tem qualquer eficácia diante da aprovação dos nossos Pais. Sim! Se pessoas tão competentes na Vida como nossos Pais têm Orgulho da gente, não vai ser outra pessoa que desmerecerá nossa Honra! Por isso, digo aos Pais atípicos: tenham orgulho e incentivem seus Filhos porque vocês terão orgulho deles e principalmente eles terão orgulho de si mesmos, independentemente da condição neuroatípica deles!

Orgulho, é também, um ato de reflexão! Auto reflexão sobretudo. E me pergunto todos os dias; se me sinto orgulhoso o suficiente para realizar algo do qual os outros, também, sintam orgulho de mim. Não se trata de uma “auto cobrança”, mas de um belo exercício de respeito por mim e pelos outros! De certo modo, sei que muita gente espera muito de mim, mas, tudo bem! Eu também, espero muito de mim mesmo! Muitos dos “muros” que construíram para eu não seguir em frente, eu não consegui destrui-los, mas escalei todos eles! E cheguei do outro lado. No lado que eu queria estar!

Vejo o mundo de maneira diferente desde muito menino e isso é parte de mim. Isso, isso tudo, é parte do Homem que me tornei. Cresci com as pessoas querendo conhecer quem era o Filho do Chico, meu Pai se chamava Francisco, era tão embaraçoso para mim. Um garotinho Autista de 2 anos de idade, minha Mãe dizia que eu era invariavelmente pouco simpático com aqueles estranhos a mim que queriam me pegar no colo. Me sentia uma atração de circo, culpa do meu Pai que era um homem muito popular na cidade. Quando eu já era adulto, referindo-se a mim, às vezes meu Pai dizia para minha Mãe; “Sônia, esse cara é bem bonito. Meu Deus!” Era engraçado isso. Nem sei porque ele dizia isso, já que a gente se parecia tanto. Acho que ele se via em mim quando ele era jovem. Deveria ser isso. Já estou mudando de assunto novamente. Vou parar por aqui. Preciso comer algo. Apesar do frio quero tomar sorvete. O curioso é que tomar sorvete me dá muito tesão. Era muito comum na minha adolescência eu e alguns amigos assistir a filmes de terror tomando sorvete. Cada um com seu pote e tomando com colher. Bons tempos... Sorvete de chocolate para mim. Ou de qualquer sabor, de qualquer marca. Mas, sorvete! Soverte tem gosto de DEUS!

Ernane Alves