Neurodiversos nos Esportes e na prática de Atividades Físicas. [ARTIGO]

Parceria NUTRI SUPLEMENTOS Pedro Leopoldo
Ernane Alves foi fotografado por Roger Rafael. Parceria Nutri Suplementos Pedro Leopoldo.

A minha baixa autoestima nunca me deixou exercer o ato da autocontemplação. De certo, é muito saudável, se em ‘doses’ acertadas, a gente ‘se curtir’. Cuidar do corpo e da mente pode ser uma ação de auto salvamento. Parece exagero?! Comumente, Autistas de Nível 1, como eu, sofrem de crises existenciais e tendem à depressão. Muitas vezes, olho “tudo” a minha volta e nada faz o menor sentido. Não sei dizer ao certo, quantas vezes que o meu dia começou ruim e seguiu assim ao longo das horas e nada mudava/melhorava. E o pior; sem um motivo pra eu justificar. Por vezes, mudei o meu horário de ir à academia só para aquela angustia toda passar. Sim! Encontrei na musculação, há cerca de 04 anos, uma atividade que ‘eleva’ a minha autoestima. Desde muito menino tive interesse por esportes. Se por um lado, a questão da “competição” sempre foi um “fantasma” que me atormentara – isso porque eu nunca acreditei muito em mim mesmo –, por outro lado a prática do esporte em si sempre foi um exercício de autoconhecimento e, sobretudo, de tentativas de socialização.

Entre os anos de 1991 e 1996, fiz muita trilha de bicicleta; Mountain Bike. Isso em Pedro Leopoldo-MG, minha Terra Natal. Contudo, minha paixão por lutas vem desde muito menino. Como eu gostava de assistir aos filmes do Bruce Lee. Na adolescência foi Rocky, o lutador, vivido com maestria pelo emblemático Stallone (que inclusive, é pai de um Autista) que aguçou ainda mais minha vontade de fazer alguma luta. Conheci o Boxe e me apaixonei. Treino Boxe desde 2008. E esse esporte me trouxe muito equilíbrio emocional e melhorou, e muito, a minha coordenação motora. Já a prática de Mountain Bike foi algo muito orgânico, que resgatei no final de 2021, isso porque; desde menino eu já tinha uma habilidade incomum sobre ‘duas rodas’. Mas, a luta, o Boxe, além de todo o glamour em torno do esporte, isso desde as roupas, luvas, calçados etc, tem a questão da disciplina. A DISCIPLINA. Além do meu diagnóstico (tardio) de Autismo, tenho uma comorbidade associada, o TOD (Transtorno Desafiador de Oposição). Apesar de toda a insegurança que vivi desde minha mais tenra infância, e de ter sido um menino muito bem educado que sabia respeitar o espaço dos outros, eu tinha/tenho muita dificuldade em receber ordens. O meu comportamento desafiador e ‘desobediente’ ante a uma figura de autoridade que marcou a minha infância, é uma “característica” presente até hoje. Porém essas características eram mais aguçadas no minha infância, marcada por uma postura por vezes agressiva, humor irritável e uma tendência de índole vingativa.

Como cresci sem um diagnóstico, conviver comigo mesmo sempre foi muito difícil e desafiador para mim, creio que até um tanto misterioso. Misterioso, porque naquela época eu não sabia o que havia de “errado” comigo, já que eu era bastante diferente dos outros garotos. De algum modo, busquei por conta própria, uma “alternativa” para ‘tratar’ minhas crises, muitas vezes externadas com violência, especialmente no tempo de adolescência, época onde os hormônios desafiam nossa própria sanidade. Sim! Ao contrário do que muitas meninas pensam; NÂO, NÂO é fácil ser menino também. Especialmente numa sociedade moldada por uma masculinidade tóxica, onde nós, os meninos, temos que demonstrar FORÇA a todo tempo. Acabei de me lembrar da linda canção do The Cure; Boys Don’t Cry, que diz: “Eu tento rir disso tudo. Escondendo as lágrimas em meus olhos; pois Garotos não choram!”.

O TOD afeta muito o adolescente com Autismo e pode comprometer o seu desenvolvimento. Quando o indivíduo apresenta padrões persistentes de comportamento negativista, como no meu caso, o seu grau de irritabilidade pode leva-lo a uma crise, dependendo da situação. Por exemplo; ainda nos dias atuais tenho traços muito marcantes do TOD; se estou no caixa do supermercado esperando a operadora finalizar o valor da compra e eu já estou com o cartão em mãos, digo: - “Vou pagar no débito.” Fico de olho na maquininha, porque ela mostra que é para inserir o cartão nela. Daí, quando já estou inserindo o cartão, a funcionária diz: - “Pode inserir o cartão.” Quando ouço essa ‘ordem’ fico bastante irritado. Sério isso! Perdi a conta das vezes que me ‘desorganizei’ só de ouvir esse ‘comando’. Já, inclusive, deixei de pagar no cartão para pagar em dinheiro (mesmo com toda a modernidade dificilmente ando sem dinheiro em espécie), só para não seguir uma “ordem” do operador de caixa. Simplesmente digo: - “Vou pagar em dinheiro.” Parece bobo, mas, seguramente a ideia de estar recebendo uma ordem é o suficiente para me irritar, sobretudo uma ‘ordem’ de uma ação que eu já estava para fazer, sem precisar de orientação. O autocontrole emocional é muito trabalhado nas aulas de Boxe. Por isso, minha paixão por esse esporte.

Estava falando sobre a musculação, que muitas vezes, o simples ato de ir à academia me ‘salvou’ de mergulhar numa melancolia sem fim. A ideia de que estava cuidando de mim mesmo, corpo e mente, me ajudou a ‘salvar’ o meu dia! Não há a menor dúvida dos benefícios das atividades físicas para os seres humanos, neuroatípicos ou não. No caso dos esportes, a grande questão é encontrar uma modalidade que o indivíduo com TEA se ‘encontrará’. É difícil encontrar a atividade ideal? Não! Na verdade, é bem simples; assim como os neutípicos, a pessoa com Autismo deve iniciar a prática de algum esporte que em princípio lhe chame a atenção. Se logo nas primeiras aulas a pessoa perceber que não era exatamente o que esperava, ela deve imediatamente buscar outra opção de esporte, até encontrar o que busca. A dica é; não desista nas primeiras tentativas. Eu por exemplo, apesar de ter interesse por esportes desde muito novinho, nunca gostei da ideia de ir malhar na academia. No entanto, descobri uma paixão pela musculação que nunca pude arquitetar. Treino seis vezes por semana. Para se ter uma ideia, durante o período mais grave da pandemia de Covid 19, onde as academias estavam todas fechadas em função do lockdown (confinamento), eu passei a treinar em casa. E mantive os mesmos resultados que tinha na academia, isso, adaptando os respectivos exercícios. Vide Calistenia (um método de treino com exercícios que se usa apenas o peso do corpo). Fazer flexões é o mesmo que praticar calistenia. Quando você faz uma flexão de braço, está trabalhando os músculos do peitoral, bíceps, tríceps, ombros, abdômen, lombar e, até mesmo, dos membros inferiores. E há diversas formas de se fazer flexões, isso apenas, mudando a angulação dos braços e/ou alterando a inclinação entre o corpo e o solo.

As atividades esportivas devem ser incentivadas desde a infância, pois já é de amplo conhecimento os benefícios que elas trazem tanto para o desenvolvimento físico como para as funções cognitivas, tais como memória e atenção.

No caso de Autistas, a prática de esportes é terapêutica. Acompanhada por profissionais da área e se preciso o apoio de uma equipe multidisciplinar estimula o cérebro, desenvolvendo as potencialidades motoras, físicas e emocionais. O esporte melhora a coordenação motora, o equilíbrio, o tônus muscular, a força, a percepção do próprio corpo e espaço. Pode ainda melhorar a autoconfiança. Os esportes possibilitam interação com outras pessoas, por experiência própria sei que não é fácil, mas, pode ajudar na socialização. Toda e qualquer prática esportiva deve ser incentivada; natação, basquete, futebol, bicicleta, lutas, etc.

Por fim, mas, não menos importante, falei um pouco sobre autoestima. Especificamente sobre a minha baixa autoestima. Mas, é muito bom quando estou sem camisa num grupo de amigos e eles comentam o quão lindo está o meu corpo ou me pedem dicas de como melhorarem o condicionamento físico deles etc. E isso, não trata-se apenas de estética. Porque para ter um corpo bem definido e que chame a atenção, além de um treino pesado e dieta regular associada a suplementos de alta qualidade, a DISCIPLINA é fundamental para que venham os resultados. Não existe “fórmula mágica”. É treino, alimentação, treino, mais treino, disciplina. E tudo isso junto e bem equilibrado traz muitos outros benefícios, que inclui o equilíbrio emocional e a sensação de bem estar.

Preciso ir dormir agora, porque vou pedalar amanhã bem cedo. O sono é outro aliado, não apenas para o corpo ideal, mas também, para uma mente descansada e sadia.

Ernane Alves