Ganhador de três Prêmios Jabuti escreve sobre novo livro de Ernane Alves [CRÍTICA]


O escritor João Anzanello Carrascoza, que é considerado uma das grandes revelações da ficção brasileira e um dos maiores contistas contemporâneos, acaba de escrever uma crítica sobre o segundo livro de Ernane Alves.

Natural de Cravinhos/SP, o escritor João Carrascoza, é também, redator publicitário e professor na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Detentor de três Prêmio Jabuti, Carrascoza, conheceu o estreante na literatura, Ernane Alves, durante a FLITI – Feira Literária de Tiradentes, em 2022, onde participaram como autores convidados. Posteriormente, Carrascoza escreveu para o Ernane elogiando o seu primeiro livro Colapso Azul (2021).

Em novembro de 2023, durante o FLITABIRA – III Festival Literário Internacional de Itabira, os autores se reencontraram. Na ocasião, João Carrascoza conheceu o segundo livro de Ernane, que teve lançamento no festival.

Intitulado O Garoto Satélite, a obra teve seu lançamento físico em 2023. O livro que vem recebendo ótimas críticas de profissionais da literatura e da psiquiatria, já passou pela XIV Bienal Internacional do Livro de Pernambuco, a maior do Nordeste, foi lançado na 69ª Feira do Livro de Porto Alegre, que é o maior evento literário a céu aberto da América Latina e o mais antigo do Brasil, entre outros eventos literários.

 

Um Universo Literário Em Expansão

A memória social negocia continuamente, entre as gerações, as luzes que devem continuar relampejando em forma de livres lembranças e as sombras que precisam se recolher no cárcere escuro do esquecimento. A memória individual também. E nesse segundo livro de Ernane Alves, O Garoto Satélite, vamos encontrar o que poucas, raras vezes, se vê na literatura: uma obra na qual as recordações de um escritor (autista nível 1) superam o breu dos falsos pudores e alcançam a qualidade de alta narrativa, ao substanciar com sinceridade explícita as venturas e amarguras de sua vida sexual. Se na estreia literária – e meteórica – com Colapso Azul, Ernane nos apresentava a sua história pessoal, sublinhando os efeitos de sua condição nos dutos da alma, nas páginas desse novo volume o corpo ganha o protagonismo. A estrutura da obra se vertebra na arquitetura da rede semântica do nosso sistema solar, espraiando metáforas de seu percurso erótico e amoroso pelo Céu Estelar, pela Via Láctea, pelos Anéis de Saturno etc., em conjunção com as forças contrárias do lixo cósmico, da inevitável força gravitacional, dos buracos negros da dor. Isento de receios pueris de se revelar, Ernane enriquece o espaço-tempo diegético de sua trama com fotos e, principalmente, fatos, e como se posicionou ao enfrentá-los. Um livro que não cai na sedução da receita prescritiva, do conselho balsâmico, da mentira apaziguadora. Um livro de memórias abertas, que, apesar de sua beleza visceral, dos corredores de trevas atravessados por seu autor, é um cometa esperançoso, um abraço cósmico para quem, em igual ou diferente situação, arde entre os meteoros dos conceitos e dos preconceitos. Com O Garoto Satélite, Ernane Alves nos conduz ao umbral de uma humanidade não só possível, mas desejável, a ser por todos nós perseguida. E ratifica a pujança de seu universo literário em expansão.   

João Anzanello Carrascoza

Escritor

João Anzanello Carrascoza e Ernane Alves, durante o III Flitabira.